Demências: Compreender para Intervir Precocemente

As demências constituem um grupo heterogéneo de doenças neurodegenerativas que afetam predominantemente as funções cognitivas, interferindo de forma significativa com a autonomia da pessoa no seu quotidiano (World Health Organization [WHO], 2023). O termo “demência” não corresponde a uma doença única, mas sim a um síndroma clínico que engloba diversas patologias, sendo a Doença de Alzheimer a forma mais prevalente (aproximadamente 60-70% dos casos) (Scheltens et al., 2021).

O que caracteriza uma demência? 

Segundo os critérios do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-5), a demência, atualmente designada como perturbação neurocognitiva major, implica um declínio cognitivo significativo em uma ou mais áreas (memória, linguagem, atenção, funções executivas, capacidades visuo-espaciais ou sociais), que interfere com a independência funcional (American Psychiatric Association, 2022).

Etiologias e tipos de demência 

As demências podem ter origem degenerativa, vascular, infecciosa, metabólica ou traumática. Entre as mais comuns destacam-se: 

Doença de Alzheimer: caracteriza-se pelo comprometimento progressivo da memória episódica e, mais tarde, de outras funções cognitivas (Jack et al., 2018). 

  • Demência Vascular: resulta de lesões cerebrais provocadas por eventos isquémicos ou hemorrágicos múltiplos (Kalaria, 2022). 
  • Demência com Corpos de Lewy: combina sintomas cognitivos flutuantes, alucinações visuais e parkinsonismo (McKeith et al., 2017). 
  • Demência Frontotemporal: afeta precocemente o comportamento, linguagem e julgamento social, predominando em indivíduos mais jovens (Bang et al., 2015). 

Sinais de alerta e importância do diagnóstico precoce 

O diagnóstico precoce é crucial para planear intervenções adequadas, atrasar a progressão dos sintomas e promover uma melhor qualidade de vida (Livingston et al., 2020). Alguns sinais de alerta incluem: 

  • Esquecimentos frequentes que interferem com a rotina; 
  • Dificuldade em encontrar palavras ou compreender o discurso; 
  • Alterações no humor, comportamento ou julgamento; 
  • Desorientação no tempo ou espaço; 
  • Redução da iniciativa ou apatia. 

É importante diferenciar entre o envelhecimento normal e o declínio patológico. A avaliação neuropsicológica desempenha um papel central nesta distinção, ao permitir identificar padrões específicos de défice e preservação cognitiva (Lezak et al., 2012). 

Intervenção e tratamento 

Embora ainda não exista cura para a maioria das demências, há estratégias farmacológicas e não farmacológicas que visam mitigar os sintomas e preservar a funcionalidade o maior tempo possível. Os inibidores da colinesterase (ex.: donepezilo, rivastigmina) e a memantina são os fármacos mais utilizados, particularmente na Doença de Alzheimer (Birks & Harvey, 2018). 

As intervenções não farmacológicas, como a estimulação cognitiva, reabilitação neuropsicológica, terapia ocupacional e apoio psicossocial à família, têm demonstrado eficácia na melhoria do funcionamento global e na redução do impacto dos sintomas (Olazarán et al., 2010; Huntley et al., 2015). 

Envelhecimento ativo e prevenção 

Estudos longitudinais evidenciam que fatores como exercício físico regular, dieta equilibrada (como a dieta mediterrânica), estimulação cognitiva contínua, controlo dos fatores de risco cardiovascular e envolvimento social reduzem significativamente o risco de desenvolver demência (Ngandu et al., 2015; Livingston et al., 2020). 

Conclusão 

As demências são uma das principais causas de incapacidade em idade avançada, com impacto não só no indivíduo, mas também na família e na sociedade. O conhecimento sobre os seus sinais precoces, a importância do diagnóstico diferencial e a existência de estratégias de intervenção e prevenção são essenciais para uma abordagem centrada na pessoa, promotora da dignidade e da qualidade de vida. 

Publicado por:

Inês de Cabaço, MSc
Neuropsicóloga (insc. OPP 26864) 
Doutoranda em Cognição, Linguagem e Neurociências – FCSE | UCP
em 29 de julho de 2025

A Clínica da Mente LAB dedica-se ao estudo da cognição e ao desenvolvimento de estratégias para otimizar a função cognitiva e melhorar a qualidade de vida. Explore os nossos conteúdos para saber mais sobre a ciência cognitiva e o potencial do cérebro humano!

Referências bibliográficas 

American Psychiatric Association. (2022). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5.ª ed., texto rev.). https://doi.org/10.1176/appi.books.9780890425787

Bang, J., Spina, S., & Miller, B. L. (2015). Frontotemporal dementia. The Lancet, 386(10004), 1672–1682. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)00461-4

Birks, J. S., & Harvey, R. J. (2018). Donepezil for dementia due to Alzheimer’s disease. Cochrane Database of Systematic Reviews, 6, CD001190. https://doi.org/10.1002/14651858.CD001190.pub3

Huntley, J. D., Gould, R. L., Liu, K., Smith, M., & Howard, R. J. (2015). Do cognitive interventions improve general cognition in dementia? A meta-analysis and meta-regression. International Psychogeriatrics, 27(11), 1781–1794. https://doi.org/10.1017/S1041610215000922

Jack, C. R., Bennett, D. A., Blennow, K., Carrillo, M. C., Dunn, B., Haeberlein, S. B., Holtzman, D. M., Jagust, W., Jessen, F., Karlawish, J., Liu, E., Molinuevo, J. L., Montine, T., Phelps, C., Rankin, K. P., Rowe, C. C., Scheltens, P., Siemers, E., Snyder, H. M., & Sperling, R. (2018). NIA-AA Research Framework: Toward a biological definition of Alzheimer’s disease. Alzheimer’s & Dementia, 14(4), 535–562. https://doi.org/10.1016/j.jalz.2018.02.018

Kalaria, R. N. (2022). The pathology and pathophysiology of vascular dementia. Neuropharmacology, 206, 108931. https://doi.org/10.1016/j.neuropharm.2021.108931

Lezak, M. D., Howieson, D. B., Bigler, E. D., & Tranel, D. (2012). Neuropsychological assessment (5.ª ed.). Oxford University Press.

Livingston, G., Huntley, J., Sommerlad, A., Ames, D., Ballard, C., Banerjee, S., Brayne, C., Burns, A., Cohen-Mansfield, J., Cooper, C., Costafreda, S. G., Dias, A., Fox, N., Gitlin, L. N., Howard, R., Kales, H. C., Kivipelto, M., Knapp, M., Kuh, D., … Mukadam, N. (2020). Dementia prevention, intervention, and care: 2020 report of the Lancet Commission. The Lancet, 396(10248), 413–446. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30367-6

McKeith, I. G., Boeve, B. F., Dickson, D. W., Halliday, G., Taylor, J. P., Weintraub, D., Aarsland, D., Galvin, J. E., Attems, J., Ballard, C. G., Bayston, A., Beach, T. G., Blanc, F., Bohnen, N., Bonanni, L., Bras, J., Brundin, P., Burn, D. J., Chen-Plotkin, A., … Kosaka, K. (2017). Diagnosis and management of dementia with Lewy bodies: Fourth consensus report of the DLB Consortium. Neurology, 89(1), 88–100. https://doi.org/10.1212/WNL.0000000000004058

Ngandu, T., Lehtisalo, J., Solomon, A., Levälahti, E., Ahtiluoto, S., Antikainen, R., Bäckman, L., Hänninen, T., Jula, A., Laatikainen, T., Lindström, J., Mangialasche, F., Paajanen, T., Pajala, S., Peltonen, M., Rauramaa, R., Stigsdotter-Neely, A., Strandberg, T., Tuomilehto, J., … Kivipelto, M. (2015). A 2-year multidomain intervention of diet, exercise, cognitive training, and vascular risk monitoring versus control to prevent cognitive decline in at-risk elderly people (FINGER): A randomised controlled trial. The Lancet, 385(9984), 2255–2263. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)60461-5

Olazarán, J., Reisberg, B., Clare, L., Cruz, I., Peña-Casanova, J., Del Ser, T., Woods, R. T., Beck, C., Auer, S., Lai, C., Spector, A., Fazio, S., Bond, J., Kivipelto, M., Brodaty, H., Rojo, J. M., Collins, H., Teri, L., & Muñiz, R. (2010). Nonpharmacological therapies in Alzheimer’s disease: A systematic review of efficacy. Dementia and Geriatric Cognitive Disorders, 30(2), 161–178. https://doi.org/10.1159/000316119

Scheltens, P., De Strooper, B., Kivipelto, M., Holstege, H., Chetelat, G., Teunissen, C. E., Cummings, J., & van der Flier, W. M. (2021). Alzheimer’s disease. The Lancet, 397(10284), 1577–1590. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)32205-4

World Health Organization. (2023, September 20). Dementia. https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/dementia